Aqueles dias foram marcados pela ansiedade, não sei se devido ao excesso de café ou a urgência dos compromissos que me envolviam. Os pensamentos vinham como turbilhão, tudo parecia tão automático que às vezes tinha que voltar em casa para saber se tinha fechado devidamente o portão. Mas, naquela manhã nublada a alegria dos passarinhos, propiciada pela chegada das chuvas de dezembro, instalou em mim um estado inexplicável que me fez sentir, como nunca, a doçura da ameixa que acabara de levar à boca. O paraíso estava ali bem em frente de mim e eu não percebera que milagre era saborear compassadamente cada fio daquela polpa macia que contrastava perfeitamente com o azedinho leve da casca.
Comecei a pensar que antes daquela ameixa estar ali ela tinha se feito flor e crescera devagar, sol a sol, lua a lua, sob os cuidados de alguém que, com paciência, esperou seu crescimento e o dia da colheita. Uma ameixa que, apesar de única, era o resultado da conjunção de todos os elementos: o fogo, a terra, a água e o ar estavam ali como o tenro fruto de uma alquimia inigualável e simples.
Há algum tempo um amigo havia me dito que Deus está nos detalhes, mas nunca pensei que a simples alegria dos passarinhos com a chegada das chuvas e aquela humilde ameixa que chegara à minha mesa fossem capazes de revelar a grandeza que existe nas coisas simples. Daquele dia em diante passei a olhar tudo a minha volta com mais atenção e descobri que o tão falado Reino de Deus é algo tão simples, próximo e óbvio que termina por passar despercebido aos olhos apressados do dia a dia.
(*) PAULO WAGNER DE OLIVEIRA é Escritor, Jornalista e Mestre em Estudos de Linguagem pela UFMT e escreve para HiperNotícias aos sábados. E-mail: [email protected]
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