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Quarta-feira, 22 de Maio de 2019, 18h:32

Segunda edição do evento “Adoção na Passarela” gera polêmica nacional

KHAYO RIBEIRO

Contrariando as expectativas da equipe organizadora do “Adoção na Passarela”, evento realizado para sensibilizar e dar visibilidade à adoção de crianças e adolescentes, o desfile de 20 menores gerou uma polêmica, dividindo opiniões até mesmo na esfera nacional. O evento foi realizado na noite de terça-feira (21), em um dos principais shoppings centers de Cuiabá, sob autorização legal das varas de Infância e Juventude da Capital e de Várzea Grande, assim como do Poder Judiciário.

Reprodução/HNT

adoção na passarela

 Material de divulgação do evento

Contando com a participação de uma criança de sete anos e 19 adolescentes maiores de 12 anos, o evento faz parte da Semana da Adoção, que teve uma programação com diversas atividades além do desfile. O Adoção na Passarela foi realizado pela segunda vez, oportunizando, novamente, que adolescentes enquadrados no que se chama “adoção tardia” pudessem ser visibilizados.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em conjunto com a Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) – realizadoras do evento – vieram a público se manifestar sobre diversas declarações feitas na mídia, que criticaram negativamente o encontro.

“Nunca foi o objetivo do evento – parte integrante de uma série de outros que compõem a “Semana da Adoção” – apresentar as crianças e adolescentes a famílias para a concretização da adoção. A ideia da ação visa promover a convivência social e mostrar a diversidade da construção familiar por meio da adoção com a participação das famílias adotivas”, narra trecho da declaração das instituições. O posicionamento, na íntegra, pode ser conferido ao final da matéria.  

Na nota divulgada, as organizadoras ainda lembram que nenhuma criança ou adolescente foi obrigado a participar do evento. Apontam também, que os jovens desfilaram juntos de seus “padrinhos” ou com seus pais afetivos.

Em um vídeo que circula nas redes sociais, é possível ver uma adolescente se mostrando muito grata pelo espaço, felicitando, inclusive, o fato de ter tido a oportunidade de encontrar uma família em virtude da iniciativa. “Eu quero dizer que todos possam abrir seus corações”, diz a jovem emocionada.

Ao HNT/HiperNotícias, a diretora social da Ampara, Tatiane Barros Ramalho, argumentou que as críticas negativas em desfavor da iniciativa são “distorções” da realidade. Segundo ela, o espaço de encontros foi tão bem sucedido em sua proposta de sensibilizar a população quanto ao tema que já houve manifestação de interesse em adoção.

“Já vieram procurar a Ampara dizendo que querem adotar. Eram padrinhos e agora querem ser pais adotivos”, diz Ramalho ao relembrar que duas famílias demonstraram interesse na adoção de adolescentes enquadrados fora do padrão de preferência.

O caso

Reprodução/HNT

twitter de guilherme boulos.jpg

 Tweet de Guilherme Boulos

Na esfera local, o renomado advogado Eduardo Mahon proferiu duras críticas ao evento. No Facebook, o advogado até relacionou o evento à “antiga feira de escravos, onde os senhores viam os dentes e o corpo dos africanos para negociar o lance”. Na publicação, muitos foram os comentários sobre o caso, concordando com o posicionamento ou não. “Um desfile é algo bacana de se fazer... O que ficou péssimo foi aliar o desfile com a adoção! Não ficou nada legal”, diz um dos comentários.

Nacionalmente, até mesmo o ex-presidenciável Guilherme Boulos proferiu críticas à postura da organização do evento. Ele considerou uma “perversidade inacreditável” a “exposição” das crianças.

A divisão de opiniões quanto ao caso foi tão grande que alcançou espaço em diversos jornais de grande circulação nacional, como: BBC Brasil; Extra Online; Correio 24 Horas; Isto É; Terra e diversos outros periódicos.

Retornando a Mato Grosso, até mesmo a Defensoria Pública do Estado emitiu uma nota repudiando o evento.

A Defensoria Pública de Mato Grosso, por meio dos defensores públicos que ao final assinam, repudia veementemente o evento denominado 'Adoção na Passarela', realizado no dia 21/05/2019 pela Associação Mato-Grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) em parceria com a Comissão de Infância e Juventude (CIJ) da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT)”, narra a nota – que foi assinada pelos defensores Márcio Bruno Teixeira Xavier de Lima e Cleide Regina Ribeiro Nascimento. 

Frente à situação, a OAB e a Ampara se manifestaram publicamente. Confira o posicionamento das instituições abaixo.

“Diante da repercussão do evento 'Adoção na Passarela', realizado pela Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (AMPARA) e pela Comissão de Infância e Juventude (CIJ) da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT), as instituições vêm a público esclarecer que:

- Nunca foi o objetivo do evento – parte integrante de uma série de outros que compõem a 'Semana da Adoção' – apresentar as crianças e adolescentes a famílias para a concretização da adoção. A ideia da ação visa promover a convivência social e mostrar a diversidade da construção familiar por meio da adoção com a participação das famílias adotivas;

- Nenhuma criança ou adolescente foi obrigado a participar do evento e todos eles expressaram aos organizadores alegria com a possibilidade de participarem de um momento como esse. A ação deu a eles a oportunidade de, em um mundo que os trata como se invisíveis fossem, poderem integrar uma convivência social, diretriz do Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária. Esse evento, inclusive, ocorre pela segunda vez;

- Crianças e adolescentes que desfilaram o fizeram na companhia de seus “padrinhos” ou com seus pais adotivos. A realização do evento ocorreu sob absoluta autorização judicial conferida pelas varas da Infância e Juventude de Cuiabá e Várzea Grande, bem como o apoio do Poder Judiciário.

- A OAB-MT e a Ampara repudiam qualquer tipo de distorção do evento associando-o a períodos sombrios de nossa história e reitera que em nenhum momento houve a exposição de crianças e adolescentes;

- Vale destacar que o desfile foi apenas uma das ações da “Semana da Adoção”. Ao longo dos dias do evento foram realizados também palestras, seminários e recreação para as crianças;

- A falta de interessados na chamada 'adoção tardia' faz com que seja urgente a adoção de medidas como a Semana da Adoção, que tornam público esse problema social. Conforme o Relatório de Dados Estatísticos do Cadastro Nacional de Adoção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 8,7 mil crianças e adolescentes aguardam por uma família.

- Na edição anterior do evento, realizado em 2016, dois adolescentes, cujo perfil está fora dos parâmetros de preferência da fila de interessados, foram adotados graças ao trabalho realizado, que deu visibilidade à questão. A iniciativa tem sido tão exitosa na forma como aborda o problema que outros Estados realizaram eventos semelhantes, como 'Esperando por você' (ES), 'Adote um Pequeno Torcedor' (PE) e 'Adote um Pequeno Campeão' (MG);

- Por fim, a Ampara e a OAB-MT, realizadoras do evento, agradecem a disposição de todos os demais órgãos e entidades apoiadores, dentre eles o Tribunal de Justiça de Mato Grosso e o Pantanal Shopping, por entenderem a grandeza de sua finalidade e abraçarem, de forma voluntária, a causa da adoção no Estado. Também conclamam a sociedade em geral para uma discussão séria e efetiva sobre o tema para que mais estratégias possam ser adotadas em prol do direito de possibilitar o acolhimento familiar a essas crianças e esses adolescentes".