Para mostrar como a agressão às mulheres está presente no dia a dia nacional, as diretoras usam estratégias variadas. O filme começa com alguns planos aéreos de cidades, que mostram as pessoas diminutas vistas do alto. A essas cenas mesclam-se vozes femininas relatando casos em que foram, de maneiras e graus diferentes, molestadas por homens. Até que essas vozes se fundem e formam um todo. Como a dizer que se as queixas são particulares e únicas, todas se confundem numa atitude básica de desrespeito ao Outro. Ou, no caso, à Outra.
Falando no geral, o filme se particulariza em três personagens - uma moça da Bahia, uma professora de São Paulo, uma atriz transgênero do Gama, cidade-satélite de Brasília.
A elas se juntam algumas especialistas, militantes e pensadoras da causa, como a filósofa Djamila Ribeiro, que ajunta outra camada ao tema: o que significa, nesta sociedade, ser mulher e, ainda por cima, mulher negra? Enfim, num filme polifônico, são várias vozes femininas falando de si mesmas.
Como contraponto há uma espécie de grupo de discussão masculino debatendo a questão. Uma espécie de "outro lado", embora incompleto. E por quê? Porque se trata de um grupo de homens de notória boa vontade em relação ao tema. Fazem autocrítica de posições machistas, questionam-se, perguntam-se o que pode ser feito para melhorar o relacionamento entre homens e mulheres.
A ideia do grupo de discussão é boa. Mas perde a oportunidade de discutir de maneira radical o que significa ser homem numa sociedade machista. Ou seja, educada para ser machista e portanto dependente de uma difícil "deseducação", uma transformação radical de hábitos e pensamentos para que de fato mude de comportamento. Haveria que estudar esse machismo estrutural em que todos somos formados, mulheres inclusive.
Mais interessantes são os depoimentos das três personagens femininas, cada qual com sua experiência em violência e discriminação. A moça baiana, obesa e de classe popular; a professora de classe média que vai de bicicleta ao trabalho e sente-se alvo de gracejos (muito pouco engraçados) e outras agressões verbais. Por fim, a atriz transgênero, vítima não apenas de machismo que, nesses casos, atinge seu grau mais violento, mas também de intolerância religiosa. Durante uma performance na Rodoviária de Brasília, é abordada, de maneira agressiva, por uma mulher evangélica que a acusa de estar doutrinando crianças para que sejam gays.
Compõe-se assim um painel do cerco às mulheres - por atitudes sociais, por uma legislação deficiente, pela intolerância religiosa.
Com esse panorama, Chega de Fiu Fiu cumpre sua função de conscientização e auxílio a uma causa. Pode-se alegar que seja insuficientemente dialético ou pouco preocupado com aspectos formais da cinematografia. No entanto, chega às telas neste tempo de saturação, em que uma questão, silenciada por séculos, aflora na sociedade e exige solução. É nesses momentos que as coisas podem mudar e o cinema ser uma linha auxiliar dessa mudança.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
(Com Agência Estado)
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